Ah, como eu me divirto desvelando as inúmeras faces que o mundo encobre. Como é bom perceber as dissimilitudes de cada indivíduo e sentir-se, ligeiramente, tocada por elas.
Outro dia, fui convidada para participar de um jantar com bruxas. Pasmem, é a mais pura verdade!
O banquete transcorreu em um belo castelo à beira mar, ornamentado com abóboras luminosas no jardim. A mansão abrigava ainda um imenso lago azul e diversas tendas para comportar as eufóricas convidadas e a animada orquestra.
Todo o entorno me parecia muito escabroso, porém a cena mais grotesca e terrificante ocorreu algumas horas após o início da festa: dezenas delas, jovens e idosas, portando vassouras e trajadas em cores vivas, como o púrpura e o escarlate, dançavam ritualisticamente entre si e em torno do grande caldeirão, do qual exalava uma densa nuvem de fumaça.
Vale salientar que não traziam maçãs enfeitiçadas. Substituíram-nas por IPhone’s de última geração que, em segundos, podem seduzir seus alvos à distância.
Inebriadas, a maioria delas segurava um copo, o qual se agitava no ritmo da música, contendo cubos de gelo e uma misteriosa poção dourada que, aos poucos, elas iam ingerindo. A cada gole, o esplendor e a grandeza da festa se espalhavam entre os comensais.
Fisicamente, elas pareciam assustar e amedrontar os mortais. Unhas pontiagudas, excesso de maquiagem na face, sobrancelhas tatuadas, ácido hialurônico nos lábios, expressões botox-modificadas e pelancas, muitas pelancas, que disputavam um lugar entre as transparências e os decotes mais ousados.
Nada de chapéus pontudos: as bruxas contemporâneas os deixaram de lado para exibir suas longas madeixas blondes, sob o encanto da escovas progressivas.
O pior aconteceu à meia noite. Neste instante, a magia expirou. Descobriu-se que interiormente elas eram vazias. Suas vidas eram ocas. Foi, então, que cheguei à conclusão que brincar de enfeitiçar pessoas e objetos, comprar ingredientes mágicos para suas poções de rejuvenescimento, percorrer o mundo em cima de vassouras encantadas não têm sentido se elas não são capazes de cultivar laços de amor e afeto com os mortais que as rodeiam.
Infelizmente, com a mesma desenvoltura que elas invadem o shopping center e os consultórios de cirurgiões plásticos, abarrotam os divãs das salas de análise à procura de um sentido para as suas vidas...
E aqui digo eu: “Afeto, bruxas! O segredo está só no afeto”.
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